Há portas que quando se abrem nos revelam um outro mundo. Ou, pelo menos, uma forma diferente – tão antiga quanto renovada, tão bela quanto surpreendente - de olharmos para o mesmo mundo: o nosso, o dos outros, o de agora, o de antes e até o do futuro.
Há portas que quando se abrem permitem o acesso a espaços do sonho e de sonho, a espaços onde reina a fantasia, onde se escrevem e reescrevem histórias de Era Uma Vez, onde podemos ver sorrisos nos olhos das crianças, memórias projectadas como filmes rebobinados nos pensamentos dos adultos, onde o tempo (agora sempre tão apressadamente rápido) parece que pára para todos.
E ainda há portas que nos abrem caminhos para a imaginação, a criatividade, para o desejo e para a força de se ser criança, da criança que pensa “O que hei-de eu ser quando for crescido”, mas também portas que nos devolvem ao lugar do que somos agora, do que já fomos antes, como se aos adultos fosse então justo perguntar numa simplicidade desconcertante: “E tu, que querias ser se voltasses a ser pequenino?”
As portas deste Museu que agora abre são portas grandes, que sem barreiras ou tapumes dão acesso ao espanto, à admiração, à alegria! São elas que agora permitem aceder a salas e salas onde todos podem livremente percorrer as brincadeiras preferidas das suas vidas e ouvir de novo (como sempre) as vozes, os risos, a alegria, as correrias ou o silêncio de quem quer brincar só mais um bocadinho…
Cuidado, este carrinho veloz vai chegar à meta em primeiro lugar!
Dorme bem, querida boneca do meu coração.
Agora tu, agarra a espada, olha o inimigo ali atrás escondido, dispara rápido!
Batota, batota, joga outra vez que assim não vale…
Ó mãe, ele não me empresta o avião que voa de verdade…
Filha, agora eu era a tua mãe e tu eras a minha filha, ouviste? Vou servir-te um chazinho e tu portavas-te bem!
Calhou-te cinco, avança três casas…
Este Museu nasceu de um sonho. E de dar a quem o visita o espaço de entender a importância do brincar. Todas as crianças saudáveis sabem como isso é importante. Conhecem a palavra muito bem, soletram-na, agem-na sempre que podem, muitas vezes ao dia, vários dias ao ano. Brincar é fundamental no desenvolvimento infanto-juvenil: é espaço de ilusão que exprime o pensar e o sentir de um menino ou de uma menina, mas também é espaço de construção de um mundo emocional e cognitivo que está a crescer em constante adaptação a tudo quanto o rodeia. Brincar molda vidas. Brincar exprime vida. Brincar salva vidas!
Hoje, nem sempre se brinca muito, nem provavelmente das formas mais saudáveis e criativas. A televisão, a imagem, as novas tecnologias tomaram conta de forma quase exclusiva de um certo espaço da vida psíquica dos mais novos. Os pais, as famílias, as escolas, queixam-se da falta de tempo, da aparente apatia, da desconcentração ou do desinteresse de crianças e adolescentes. Talvez haja um fundo de razão em toda essa queixa, mas não podemos esquecer que as crianças modelam-se. Elas são, em cada momento, fruto do que quem cuida delas lhes quis ou pôde dar. E, do mesmo modo, não podemos esquecer que são os mais novos os melhores detentores da força, do impulso, do desafio de cada tempo que se vive no espaço presente. Qualquer investimento que se faça nesta área valerá sempre a pena! E não tem preço, como assim o não tem a vida, o afecto ou o amor pelo outro, sobretudo por aquele que para crescer saudável depende totalmente dos outros.
Mas, estou certo que este Museu não será só um espaço dedicado aos mais novos. Não só porque da sua impressionante colecção fazem parte brinquedos que vão desde os tempos actuais a outros muito antigos (que facilmente vão trazer à memória belas recordações de outras crianças agora já pais, tios, avós ou bisavós), mas também porque os adultos mais saudáveis transportam em si próprios, mesmo que disso não dêem conta, uma enorme parte infantil. Sobre isso, João dos Santos, um famoso médico pedopsiquiatra, escreveu um dia: “Se podes ser infantil, podes ser Homem, podes ser Mestre”. Estou certo, repito, que este Museu reforçará laços geracionais, aproximará vivências, fortificará raízes que darão, mais tarde, novos ramos, Homens mais felizes, saudáveis e justos, Mestres mais capazes de passar a riqueza das suas experiências a todos quantos ainda estão a crescer!..
Abrem-se então as portas deste Museu. O sonho torna-se realidade. Na vila mais antiga de Portugal, beleza do Minho, exemplo de preservação do património e de vida cultural profundamente enraizada nos usos e costumes das suas boas gentes, na belíssima Casa do Arnado que olha com deslumbre as águas do Lima e a secular ponte romana, nasce agora o Museu do Brinquedo Português.
Quando há quatro anos atrás propus a ideia ao então Presidente da Câmara Eng.º Daniel Campelo, pela mão sempre amiga e dedicada do Dr. Franclim Sousa, Vereador da Cultura, ideia depois prontamente acarinhada pelo Eng.º Victor Mendes, actual Presidente da C.M.P.L., não pensei que o sonho pudesse concretizar-se imediatamente. Nem tão-pouco num tempo que foi célere, fruto do desejo da obra ver abertas as suas portas de par em par, num projecto que ao ser absolutamente único engrandece Ponte de Lima, o Minho e Portugal.
Por isso, à C.M.P.L. desejo reforçar os meus sinceros parabéns, ao qual acrescento apenas um agradecimento singular de quem fica particularmente feliz por ver um espaço único que, ao ser genuinamente português, nos faz com certeza olhar para todos a quem se dedica com uma esperança renovada agora e no futuro. Obrigado!
Publicado na LIMIANA – Revista de Informação, Cultura e Turismo n.º 26, de Fevereiro de 2012
Ponte de Lima no Mapa
Ponte de Lima é uma vila histórica do Norte de Portugal, mais antiga que a própria nacionalidade portuguesa. Foi fundada por Carta de Foral de 4 de Março de 1125, outorgada pela Rainha D. Teresa, que fez Vila o então Lugar de Ponte, localizado na margem esquerda do Rio Lima, junto à ponte construída pelos Romanos no século I, no tempo do Imperador Augusto. Segundo o Historiador António Matos Reis, o nascimento de Ponte de Lima está intimamente ligado ao nascimento de Portugal, inserindo-se nos planos de autonomia do Condado Portucalense prosseguidos por D. Teresa, através da criação de novos municípios. Herdeira e continuadora de um rico passado histórico, Ponte de Lima orgulha-se de possuir um valioso património histórico-cultural, que este portal se propõe promover e divulgar.
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