A Revista Limiana, atenta às personalidades que se distinguiram na promoção e defesa da cultura do Alto Minho, tomou a feliz iniciativa de trazer à memória dos seus interessados leitores a figura do P.e Manuel Gomes Dias, cidadão de mérito do concelho de Ponte do Lima e nosso conterrâneo.
Estas minhas palavras não passam de um testemunho vivencial, adquirido durante os múltiplos contactos mantidos entre nós, que vêm dos tempos de estudantes, pois fomos contemporâneos nos estudos e partilhámos longos anos da nossa vida ativa ao serviço da Igreja e da sociedade. Não se baseia nas obras de que ele é autor, nem daquelas que ele, de alguma forma, influenciou. Deixo essa missão para outro comentador mais bem informado do que eu, sobre esse particular.
Natural da freguesia de Fornelos, concelho de Ponte de Lima (1933), o P.e Manuel Gomes Dias frequentou os seminários da arquidiocese da Braga, em ordem à vida eclesiástica, cuja formação veio a concluir com a ordenação sacerdotal, a 15/08/1958. Um acontecimento, à primeira vista fortuito – a Exposição Iconográfica Mariana, realizada em Braga, no ano de 1954 –, estimulou o nosso homenageado a despertar em si uma capacidade até então por nós desconhecida: a paixão pela investigação e pela cultura.
Os principais organizadores da referida Exposição – Cóng. Aguiar Barreiros e Cóng. Luciano Afonso dos Santos – puderam contar com a colaboração voluntária e preciosa de dois alunos finalistas de Filosofia, um dos quais foi o Manuel Gomes Dias. Esse facto possibilitou-lhe, em primeiro lugar, um privilegiado contacto com estes excelentes mestres no campo da arqueologia, arte sacra e cultura; em segundo lugar, abriu caminho para futuros encontros com estes e outros estudiosos e mestres entendidos neste como noutros campos afins do saber, como arqueologia, etnografia, história da cultura, etc., entre os quais nos apraz citar: José Rosa de Araújo, Leandro Quintas Neves, Alberto Antunes de Abreu, entre outros.
Na sua companhia, calcorreou o Alto Minho, assistiu à identificação, classificação e catalogação das peças iconográficas mais significativas da arte religiosa, e tornou-se ele próprio uma autoridade científica na matéria. Apaixonado por este campo do saber, não procurou títulos académicos mas o estudo árduo e sagaz das fontes destes saberes: «O saber de experiência feito», como diria Camões. Desta forma, a vida sacerdotal do P.e Manuel Gomes Dias foi enriquecida com uma intensa, rica e esclarecida ação cultural, patente nas publicações de que é autor e largamente reconhecida por quem toma contacto com as suas obras.
Senão vejamos: foi pároco de Sistelo, do concelho dos Arcos de Valdevez (3 anos), de Serdedelo e Boalhosa, no concelho de Ponte de Lima (7 anos), de Labruja, deste mesmo concelho (4 anos), de Nogueira, no concelho de Viana do Castelo (cerca de 35 anos), missão que ainda acumulou com Gondar, do concelho de Caminha durante um ano (1991).
Em toda a ação pastoral nestas comunidades esteve presente a sua preocupação pela defesa, classificação e restauro do património cultural, artístico e documental dessas áreas geográficas. As paróquias foram ao mesmo tempo campo de evangelização e de observação, investigação e recolha de dados culturais dos diversificados meios ambiente.
Desempenhou, paralelamente, outros cargos a nível diocesano e de âmbito local, através dos quais aprofundou os seus conhecimentos e assumiu a defesa destes mesmos valores culturais. Foi Membro da Comissão Diocesana de Arte e Cultura (1979 – 91), Diretor do Departamento do Museu Diocesano (1991 – 2008), passando a Membro Honorário quando dispensado por motivo de saúde (2008).
A nível local, foi professor em vários estabelecimentos de ensino, particular e oficial; presidiu ao Instituto Limiano – Museu dos Terceiros, na vila de Ponte de Lima; interveio em vários municípios, sobretudo no de Ponte de Lima e na região do Alto Minho em geral, onde prestou relevantes serviços culturais, sobretudo no sector da investigação arqueológica, em que demonstrou ser, ao mesmo tempo, excelente discípulo e companheiro dos mestres atrás citados. Assim se lhe referiu um presidente de autarquia: «Por sua própria iniciativa, incentivou a defesa de questões patrimoniais e culturais que, sem esse precioso contributo, estariam hoje votadas a total esquecimento».
No seu percurso de antropólogo, etnólogo, arqueólogo, professor e pároco, deu um notório contributo para a História da Cultura popular da nossa Terra. Percorreu montes e vales, na ânsia de localizar, identificar e inventariar sítios e peças arqueológicas. Desta longa, árdua e incessante pesquisa, em parceria nomeadamente com José Rosa de Araújo, viria a nascer o primeiro levantamento arqueológico do concelho de Ponte de Lima.
Mostrou especial sensibilidade para com o património arquitetónico e arqueológico da nossa região, contribuindo com o seu saber e influência para a divulgação e preservação desse mesmo património. Sempre discreto no seu modo de agir – quase sem se dar por isso – montou exposições, escreveu e colaborou em catálogos, divulgou a arte, incentivou estudos e teses, apoiou todos os que a ele recorreram. Neste campo, o município de Ponte de Lima foi o mais privilegiado. Basta recordar as inúmeras exposições realizadas, os Cortejos Históricos das Feiras Novas e o seu primeiro Catálogo, a sua investigação em arte sacra, em que se afirmou exímio datador de peças iconográficas religiosas. Em colaboração com outros cidadãos locais, foi relevante o contributo dado na dinamização do que é hoje conhecido como o Museu dos Terceiros, em Ponte de Lima, incentivando e dinamizando o seu fundador, D. Carlos Martins Pinheiro.
Foi com toda a justiça que a autarquia local lhe atribuiu a Medalha Municipal de Mérito Cultural.
Dos seus escritos, dispersos por várias publicações, apraz-nos apenas relevar o importante trabalho de equipa sobre S. Tiago nas Imagens e Caminhos do Alto Minho, e ainda, Lendas e Tradições do Caminho de Ponte do Lima a Valença.
Com este testemunho, pretendo exaltar e honrar o mérito do cidadão e Padre Manuel Gomes Dias, e associar-me à justa homenagem que lhe é prestada pela Revista Limiana e seus colaboradores.
Viana do Castelo, 31 de outubro de 2012
In: LIMIANA – Revista de Informação, Cultura e Turismo n.º 30, de Dezembro de 2012
Ponte de Lima no Mapa
Ponte de Lima é uma vila histórica do Norte de Portugal, mais antiga que a própria nacionalidade portuguesa. Foi fundada por Carta de Foral de 4 de Março de 1125, outorgada pela Rainha D. Teresa, que fez Vila o então Lugar de Ponte, localizado na margem esquerda do Rio Lima, junto à ponte construída pelos Romanos no século I, no tempo do Imperador Augusto. Segundo o Historiador António Matos Reis, o nascimento de Ponte de Lima está intimamente ligado ao nascimento de Portugal, inserindo-se nos planos de autonomia do Condado Portucalense prosseguidos por D. Teresa, através da criação de novos municípios. Herdeira e continuadora de um rico passado histórico, Ponte de Lima orgulha-se de possuir um valioso património histórico-cultural, que este portal se propõe promover e divulgar.
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