Os Morros de Nóqui têm como pano de fundo a paisagem do norte de Angola. De conto em conto, o poeta e escritor limiano envolve os leitores com o ambiente urbano e rural: «o velho edifício aduaneiro, de há muito desactivado, desde que a guerra pôs fim ao tráfego fronteiriço de pessoas e mercadorias» (1), os barracões de zinco e madeira, o estado lastimoso do asfalto, o bloco habitacional, o quartel das tropas, o arame farpado, as cubatas, as moradias, a mata verde ou calcinada, o rio, o sol, o vento, as chuvas, as árvores, o embondeiro, os bananais, o céu azul, os insectos, a fauna e a flora. Os textos são como aguarelas de cores claras e escuras. «Com as primeiras chuvas os morros de Nóqui pintam‑se de verde. Do chão calcinado pelas dantescas queimadas brotam ciclicamente, num prodígio de exuberância, searas imensas e ondulantes de novos capinzais.
É então que, das fraldas húmidas do Lué, uma fauna ávida de sol e altitude trepa as encostas com uma data de filhotes à ilharga. E também é quando, das sanzalas disseminadas além fronteira, pela calada da noite, grupos de combate munidos de catanas e canhangulos, uma que outra automática de fabrico checo ou soviético, temerariamente se embrenham nas densas matas, infestadas de pelotões emboscados e de trilhos semeados de minas anti-pessoal. (2)
A partir deste cenário, o autor urde a sua obra, dilata o olhar pelo território, observa os fenómenos da experiência humana, as marchas longas, as doenças, o fastio, o sofrimento interior, os múltiplos modos de evasão, a influência dos factos nas ideias, na mudança de valores, nas formas de agir ou de meditar. E dá-nos assim um relato verosímil, emocionante e paradoxal dos homens num tempo breve para a História, mas infinito para as suas personagens: o soldado Fatinha, o Coimbrões, o Ernesto Malafaia, o Cabo Cozinheiro Acácio Pinto, os furriéis Zeferino e Luís Castro, os Alferes Leonídio, Timóteo, Anselmo Trindade e Alexandre Meireles, o Comandante Tenente-Coronel Marcelino Serra, o Capelão Humberto.
Numa nota introdutória, Cláudio Lima, que viveu dois anos em Nóqui, adverte o leitor: «São estórias, não é História. Daí que nomes, situações, toponímias, etc., sejam fictícios, adulterados ou descontextualizados. Serão, porventura verosímeis; não são factualmente verdadeiros.» Mas na sua actividade imaginativa, a intercessão discursiva entre a realidade e a ficção não deixa de nos transmitir as percepções do mundo, os modos de pensar, os seus conhecimentos literários, históricos e filosóficos.
Notas
(1) Cláudio Lima, Os Morros de Nóqui, Opera Omnia, Guimarães, 2.ª edição, 2009, pg. 59
(2) Ide, idem, pg. 107
Publicado na LIMIANA – Revista de Informação, Cultura e Turismo n.º 14, de Outubro de 2009
Ponte de Lima no Mapa
Ponte de Lima é uma vila histórica do Norte de Portugal, mais antiga que a própria nacionalidade portuguesa. Foi fundada por Carta de Foral de 4 de Março de 1125, outorgada pela Rainha D. Teresa, que fez Vila o então Lugar de Ponte, localizado na margem esquerda do Rio Lima, junto à ponte construída pelos Romanos no século I, no tempo do Imperador Augusto. Segundo o Historiador António Matos Reis, o nascimento de Ponte de Lima está intimamente ligado ao nascimento de Portugal, inserindo-se nos planos de autonomia do Condado Portucalense prosseguidos por D. Teresa, através da criação de novos municípios. Herdeira e continuadora de um rico passado histórico, Ponte de Lima orgulha-se de possuir um valioso património histórico-cultural, que este portal se propõe promover e divulgar.
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